Os Adivinhadores

Terça-feira 14, mas não julgo que o número do dia tenha qualquer interesse. Acordar e meter uma peça de fruta na boca. Acordar a minha malta. Pegar no saco das raquetes e ir para o campo. São 8 da matina.

Um colega vai connosco, diz que quer suar e emagrecer, são as suas razões. Que coisa parva, se eu quisesse suar e emagrecer metia-me nas drogas duras, seria muito mais eficiente. Bato na bola como se batesse no mundo, com raiva e precisão, tento colocá-la no exacto ponto onde as linhas do fundo do court se cruzam, fazer com que desapareça.

Casa novamente, banho e pequeno-almoço. Sinto-me menos mal, a minha mulher está a fazer progressos visíveis e a minha filha melhorou a pancada. Neste mundo é-me importante que os meus melhorem a pancada.

Saio para trabalhar e um investidor diz-me que agora não compra nada. Vai esperar pelo fim de outubro; que aí vai estar tudo na miséria e a vender ao desbarato. Cago para ele, continuo. Um amigo com quem tomo um café e que é gerente comenta que as coisas se estão a compor, que isto é um negócio do caraças. Entretanto o meu telefone toca. É um colega que me confessa estar à rasca, que isto não se vende um corno, que está farto. Pago o café saio apressadamente. Tenho uma visita com uma cliente que me informa que os preços vão cair em Lisboa. Tretas, muito pouco científico. Estou atrasado para uma reunião de angariação. O proprietário ensina-me que os preços das casas vão subir, que o imobiliário é um activo estável e que a vinda do Papa até vai ressuscitar o Mega Ferreira e a Expo. Agradeço a lição e volto a casa para almoçar, passo por duas agências que fecharam aqui na avenida.

Um dia, lá no longínquo 1998, a Arundathi Roy escreveu num guardanapo de café o seguinte texto para uma amiga, sobre as suas regras de conduta para a vida:

“Amar. Ser amado. Nunca esquecer a nossa própria insignificância. Nunca nos habituarmos à indizível violência e à grosseira disparidade da vida que nos rodeia. Procurar alegria nos lugares mais tristes. Perseguir a beleza até ao seu covil. Nunca simplificar o que é complicado nem complicar o que é simples. Respeitar a força, nunca o poder. Acima de tudo, observar. Tentar compreender. Nunca voltar a cara. E nunca, por nunca esquecer.”

Sorrio, acabo de almoçar e volto ao trabalho. Se fosse religioso votava na Arundathi para presidente da Fé…

Compare listings

Comparar